Uma estrela chamada Lúcia

Sorridente, positiva, forte, vaidosa e apaixonada por comida, por música e TV. É assim que boa parte da equipe de Enfermagem do CTI e colaboradores de diversos setores descrevem Lúcia Maria da Costa Amaral – paciente do Hospital São José  (HSJ), Rio, por dois anos e três meses – que veio a falecer em março de 2018, aos 66 anos, após sofrer de Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), uma doença degenerativa do sistema nervoso.

Além de paciente, atuou durante 25 anos no HSJ como Técnica de Enfermagem e marcou a sua passagem na Instituição com seu sorriso, sendo agradável, solícita com todos e atenciosa com os pacientes. “Quando soube que ela estava internada em uma Unidade de Pronto Atendimento, e que precisava ser transferida para um Centro de Terapia Intensiva, fiz de tudo, junto aos meus colegas, para que pudesse ser transferida para o HSJ”, relatou Camila de Oliveira, Técnica de Enfermagem. E então, quando Lúcia precisou dos cuidados de seus parceiros de profissão, foi acolhida por sua segunda família – a equipe de Enfermagem que, sempre que possível, atendia aos seus desejos, alinhada à campanha “O que importa para você?”.

Quem entrava no quarto nº 10 do CTI do SUS percebia que era mais do que um local de internação. Era o lar da Lúcia, graças ao carinho dos profissionais, que se dedicavam a levar conforto à paciente com decoração e objetos – sempre a seu gosto. “Tinha de tudo: suas bijouterias, porta-retratos com nossas fotos e também um pen drive com músicas… ela ouvia e ficava dançando com a cabeça. Eu gostava muito dela e, sempre que podia, a presenteava com brincos”, contou a Técnica de Enfermagem Gabriela de Oliveira Pereira. Ali no quarto, houve muita diversão, mesmo diante das dificuldades.“Quando ela ainda tinha os movimentos do braço, trocava o canal da TV e nos chamava para assistirmos juntas. Também nos contava sobre os episódios das novelas que não conseguíamos assistir. E quando não deixávamos as coisas do jeito que ela queria? Ela brigava com a gente”, lembrou Cenira Siqueira do Cabo, Técnica de Enfermagem, divertidamente.

 

Uma grande família

 

“Tenho uma longa história com a Lúcia, pois ela me recebeu com muito carinho e me ensinou os primeiros passos como Técnica de Enfermagem. Foi difícil ter que lidar com ela na condição de paciente. Dia após dia, a vi enfraquecer. No primeiro aniversário dela, fizemos uma surpresa: mobilizamos todo o Hospital e familiares para fazermos uma festa. Contamos para ela que a levaríamos para o pátio tomar sol mas, quando chegamos à Recepção, dei a volta e a levei para o evento. Quando ela viu a todos, ficou muito alegre e emocionada. Ela já sabia que era muito querida por nós, mas depois dessa ação, teve certeza e se sentiu muito acolhida”, contou a Enfermeira Carla Cristina Thomaz Cruz.

Embora tivesse um filho biológico, Rafael Amaral, Andressa Alves de Paula foi “adotada” por Lúcia. “Ela me cobrava netos, inclusive. Sempre pedia para eu pentear o cabelo dela. E mais: Lúcia recebia manicure para fazer suas unhas, era muito vaidosa”, brincou a Técnica de Enfermagem, que sentiu quando a paciente estava prestes a falecer. “Na minha última revisão, ela olhou para mim e chorou. Foi a primeira vez que a vi chorar, pois sempre encarou a internação de maneira positiva. Mexeu a boca, disse que precisava descansar. Aquilo me doeu, precisei ser forte, e disse para ela descansar. Em resposta, afirmou que nos guardaria no coração. Soube que estava se despedindo. Imagine conviver com uma pessoa por dois anos, tê-la como mãe, e passar por isso? Foi muito difícil”, contou Andressa, emocionada.

E não eram apenas os profissionais da Enfermagem do CTI SUS que Lúcia considerava como sua “família emprestada”. Tatiana Guimarães Medeiros, analista da Auditoria de Contas Médicas, foi parceira de trabalho da Lúcia quando atuava no SUS e sempre a visitava no CTI – às vezes, surpreendendo a paciente com uma coxinha de frango com catupiry (um dos salgados prediletos da amiga), quando autorizado. “Era uma pessoa iluminada, que irradiava alegria, dona de um sorriso encantador. Dedicada e comprometida com o trabalho por tantos anos, sem perder sua energia contagiante. Obrigada pelo privilégio de conviver com você durante todos os anos, Lúcia”, agradeceu Tatiana, sem economizar elogios. Outras visitas frequentes levavam amor e alegria ao quarto nº 10, como conta a Técnica de Enfermagem Adriana Siqueira de Souza. “Todos os dias, ela recebia visitas das tias e de uma amiga, que só não vinha aos domingos. O ex-marido também a visitava no período da noite, além do filho”, completou.

 

E o que importava para Lúcia?

 

Comer coisas gostosas, estar sempre maquiada, com o cabelo penteado e perfumada. “Era sempre vaidosa, adorava um bom lanche e festas. Lúcia demonstrava que amava a vida intensamente”, contou os Enfermeiros Cláudia Rebello e Rodrigo Lessa. “Nunca vou me esquecer das vezes em que passava em frente ao quarto dela e ela me pedia para maquiá-la, pois gostava do estilo leve que eu fazia. Isso tudo era muito positivo para mim. Me lembro bem de como ela se sentia bem comendo algo gostoso também”, declarou a Técnica de Enfermagem Dulcineia Cardozo.  “Para Lúcia ser feliz era só dar uma comida gostosa para ela. Um dia ela desejou misto quente e servimos de manhã e à tarde. Foi gratificante ver o olhar de agradecimento dela”, completou Adriana de Souza. “Quando ela parou de engolir e também quando ela teve dermatite, impedindo-a de ser maquiada, foi muito triste, pois vimos que isso fazia falta para ela”, acrescentou Andressa de Paula. Passeios no pátio também aconteciam, conforme relatou o Enfermeiro Julian Warol.

Para Carla Cruz, que também já agradou Lúcia com chocolate e empadão, a campanha “O que importa para você?” trouxe um alento para a paciente, durante a internação. “O projeto torna possível coisas que, para a gente, são acessíveis, mas que, para os pacientes, não são. Mesmo em uma situação difícil, Lúcia estava em um local como se fosse o quarto da casa dela e nós, a segunda família. Isso a ajudou a sofrer menos”, disse. “O movimento ‘O que importa para você?’ acontecia a todo o tempo com ela. Fazíamos até mesmo sem perceber. Lúcia partiu no dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, para nunca esquecermos essa data e ela ser lembrada como a nossa guerreira”, finalizou Rafaela de Oliveira, Enfermeira.

 

Agradecimento

 

Em encontro promovido pela Gerência de Enfermagem do Hospital, com a participação de Camila Lorenz, da área Corporativa de Saúde, Medicina e Segurança do Paciente da Associação Congregação de Santa Catarina, a família teve a oportunidade de assistir a depoimentos dos profissionais que cuidaram e tiveram contato com Lúcia e aproveitaram para agradecer à equipe. “Sentia segurança no cuidado que tinham com minha mãe. Percebia que ela os tratava como família e até ficava com ciúmes”, brincou Rafael Amaral, filho. “A festa de aniversário que fizeram para a minha mãe foi a melhor que ela teve. Esse Hospital é tudo para mim. Fui criado com o que ela conquistou aqui e depois ela foi cuidada. Tenho um carinho muito grande por vocês”, completou. “A atenção que vocês tiveram com ela foi excepcional. Ela teve amor e carinho vindos de vocês. Isso é impagável”, declarou Arlete da Silva, prima de consideração da Lúcia.

Também participaram do encontro: Vera Lúcia Alexandra da Silva, tia de consideração; Ângela Nolasco, irmã da Vera, e Iolanda Rosa, tia.

Assista ao vídeo dessa tocante história:

 

 

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